Visitas Guiadas da Batoto Yetu Portugal, por James Bennett
No último mês, eu participei em duas destas visitas guiadas.
A primeira, feita por tuktuk, levou os participantes pela cidade de Lisboa, parando em sítios como a estátua de José Tomás de Sousa Martins em frente da Faculdade de Medicina e a Rua do Poço dos Negros em São Bento. Terminamos o dia com uma perspectiva de longa duração sobre a presença africana em Portugal, desde os tempos romanos até o século XX.
Embora hoje existam várias opções para visitas guiadas sobre esta presença africana em Lisboa, é esta perspectiva de longa duração que se destaca mais o trabalho de Batoto Yetu Portugal, que no seu fundo é apoiado pelos trabalhos de investigadores e académicos como a Dra. Isabel Castro Henriques, cujo livro sobre o roteiro africano em Lisboa vem como oferta no fim desta visita.
Além disso, a Batoto Yetu Portugal organiza caminhadas na região ao sul da cidade, no vale do Rio Sado.
No sábado eu participei nesta caminhada, chamada “A Ilha dos Negros”, no qual o escritor e historiador António Chainho deu uma pequena palestra sobre a história do vale que antigamente era uma zona agrícola com mais de 5.000 pessoas, 3.000 das quais eram africanos escravizados. Com o tempo, esta população africana e os seus descendentes foi se misturando com os portugueses da região e os que vieram trabalhar nos campos de sal, até que hoje a sua presença histórica não é bem reconhecida fora desta região.
Contudo, depois de aprender sobre esta história, a gente tem uma outra visão da importância dos africanos na cultura portuguesa. Por exemplo, a parte morena da “Grândola, Vila Morena” do famoso Zeca Afonso ganha outro sentido quando se dá conta da presença africana histórica nesta zona. Ou mesmo o cozido à portuguesa, com o qual terminamos a caminhada, que tem raízes nas partes dos animais como as orelhas ou as patas que foram deitados para as pessoas escravizadas naquela altura e que hoje todo o país abraça como uma tradição nacional.
Eis a importância de aprender sobre esta história no desenvolvimento da identidade portuguesa, para reconhecermos o quanto que os povos que muitas vezes são tratados como distintos são realmente entrelaçados e interdependentes. Ou seja, a riqueza de uma identidade quase sempre tem a base na relação como outro.
É essa a razão que a minha pesquisa como bolseiro Fulbright entrecruza com o trabalho da Batoto Yetu Portugal. Depois de três anos de viver em Moçambique como professor voluntário e, depois, investigador académico, eu vim a Portugal para aprender mais sobre as relações afro-portuguesas, que são complexas e longas. Neste esforço, eu trabalho com a acima referida Dra. Isabel Castro Henriques, e também com o Grupo de Investigação sobre Impérios do Instituto de Ciências Sociais. Mesmo assim, como escritor, eu sempre fico mais interessado nas pessoas e nas suas experiências do mundo. É por isso que eu tenho gostado tanto das visitas guiadas da Batoto Yetu Portugal: junta-se pessoas com origens aparentemente distintas num qualquer sábado para trocar as nossas estórias e, através disso, partimos com um descobrimento real— são as nossas diferenças que nos unem, e que nos podem sustentar.”
James Bennett é um escritor e tradutor Americano e bolseiro do Programa Fulbright para estudantes e investigadores Americanos durante 2021/2022. James realiza investigação na área da Escrita Criativa no Centro de Estudos sobre África e Desenvolvimento (ISEG-ULisboa) e colabora com a Associação Cultural e Juvenil Batoto Yetu Portugal.
Para mais informações sobre o trabalho desenvolvido pela Batoto Yetu Portugal, siga o link: https://batotoyetu.pt/pt/