«Perto do velho edifício onde milhares olham o velho Lincoln, há um sítio com papel e caneta. “Que a tua mensagem seja sentida” é a única regra. Escreveu Saudade e o seu nome…ainda não tinha partido, mas já nada mais tinha pra dizer.

Não posso falar da viagem; como explicar que as expectativas criadas ao longo de 24 horas de voo foram ultrapassadas em dois segundos de América? Também não posso falar das aulas mais interessantes a que alguma vez assisti; como recontar aquilo que aprendi de autênticos mestres? Também não posso falar dos sítios que visitei; estive nas cidades mais sufocantemente espantosas, como poderia alguma vez descrevê-las? Também não posso falar dos profissionais que conheci; empresários, criadores e inventores que levam este mundo para a frente, que mais poderia chamar-lhes além de inspiração? Também não posso falar das noites mais incríveis da minha vida, passadas a beber e a beberricar nas margens do Mississípi (água, claro!); como escolher de entre todas as palavras as certas para contar o que vi e ouvi naquelas madrugadas? Também não posso falar dos monumentos que vi na capital; a televisão não lhes faz justiça, como poderia eu? E, certamente, não posso falar das pequenas coisas que foram construindo estas grande aventura; será que poderia sequer lembrar-me de todas? Enfim, não posso falar de nada disto porque…não saberia como. Não sei fazer relatórios ou listas, relatos ou exposições. A paixão pela escrita, roubei-a a alguém que nasceu para contar histórias. Por isso aqui vai, se a habilidade mo permitir, mais um capítulo da minha história. Escrevi-o lá, do outro lado do mar. E é o melhor de todos, até agora.

Conheceu-os a todos, um por um. Eram vinte três estranhos que haviam de virar família. Se tentasse, não poderia descrever quão sublime era cada um. Havia um rapaz do norte, bem lá de cima, que o fazia sempre rir. Piadas e gracejos que ele já não sabia esquecer. Havia outro, cheio de ideias e fantasias, que o fez sonhar mais alto que nunca. Havia uma rapariga que só sabia ver o bem em todos, e ainda outra que tinha ido lá para se salvar…chegou atormentada pelos seus demónios e partiu de mão dada com eles, que orgulho! E como esquecer aquele que poderia ter sido ser irmão? Parecidos em tudo, decerto perderam a conta a tudo o que fizeram juntos.

E a pequena família lá seguiu, indiferente a tudo. Viram e fizeram e correram e saltaram e choraram e sorriram. Eram muitos e diferentes, e a verdade é que sem qualquer um deles nada tinha sido igual. As gargalhadas e as lágrimas, os desafios e os duelos, as noites em claro, enfim…nada. Como aprenderam e cresceram uns com os outros! No fim, talvez tenham todos chegado às mesmas conclusões. Que os rapazes estão hoje um pouco mais homens e as raparigas um pouco mais mulheres. Que viram e fizeram coisas com que decerto ainda nem tinham fantasiado. Que carregam agora às costas toda uma nova responsabilidade. Que estão apenas no início e que ninguém os pode realmente travar, sem ser eles próprios. E que, acima de tudo, quando olharem aquela última fotografia de grupo, daqui a muitos anos, não é sítio onde foi tirada ou o diploma que cada um segura que realmente fica…mas sim os sorrisos sinceros que espreitam no olhar de cada um, brincando para sempre no labirinto da memória.

Perto do velho edifício onde milhares olham o velho Lincoln, há um sítio com papel e caneta. “Que a tua mensagem seja sentida” é a única regra. Escreveu Saudade e o seu nome… ainda não tinha partido, mas já nada mais tinha para dizer.»

 Carlos Ferreira, Setembro de 2015

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